sábado, 13 de março de 2010

Histórias sem explicação

A propósito, vou hoje referir dois casos, narrados pelo meu pai em 1975. Conheci os seus intervenientes (já falecidos), as casas onde os factos ocorreram (ainda hoje exteriormente intactas) e posso solenemente assegurar que essas pessoas eram inteligentes, honestas, cultas e sensatas. Como é natural, o acontecido intrigou-as e a uma delas (uma senhora), o caso provocou-lhe algum susto, como descreve o meu pai:
"Uma senhora das minhas relações, respeitável a todos os títulos, conta o seguinte, com a maior das convicções. Uma das primas dela, companheira de brinquedos, foi para África, com os pais. Ora, poucos meses depois do embarque, a referida senhora (era então menina dos seus oito anos) ao passar num corredor da casa que habitava, olhou para dentro de um quarto e qual o seu espanto quando viu a amiga, deitada num caixão, com as mãos postas, os olhos fechados e com um lindo vestido azul. Assustou-se. Gritou. A mãe veio a correr...mas a aparição tinha-se sumido, como por encanto. E só a menina a vira...Passados tempos, chegou carta de África, relatando o falecimento da pequena amiga, vitimada por febre repentina. Conjugando as datas, verificou-se, com pasmo, que o enterro se dera precisamente às horas que fora vista aqui em Viana. E mais tarde, quando os africanistas regressaram em curtas férias, a mãe da morta contou que a desaparecida, nos últimos momentos, chamara a amiguinha de brinquedos e que, efectivamente, levara para a sepultura o lindo vestido azul de que gostava tanto..."
O outro caso relatado pelo meu pai também é muito curioso:
"Um amigo meu, depois de alguns anos em Inglaterra, regressou a Portugal e comprou uma casa aqui bem perto, numa aldeia junto à praia. A casa, de muito boa construção, encontrava-se desabitada havia já alguns anos, pois corria que estava assombrada. Tinha sido contruída por um capitão de navios que nela vivera e falecera em circunstâncias um tanto ou quanto misteriosas e o facto é que, os próprios herdeiros, assustados com factos estranhos - e que a habitaram algum tempo - se viram obrigados a deixá-la. Ao princípio, tentaram alugá-la, mas depois, dados os rumores que sobre ela corriam, foi posta à venda, a um preço muito convidativo. Mesmo assim, a casa conservou-se vaga, até que o tal meu desempoeirado amigo se decidiu a adquiri-la. Vinha, como disse, de Inglaterra - país muito dado a fantasmas domésticos e onde não há castelo nem casa senhorial que se preze que não seja visitada por fantasmas, mais ou menos terrificantes. Achou graça ao que se dizia e isso serviu-lhe, até, de incentivo. Lá instalado, o certo é que factos anormais - ruídos maiores ou menores, absolutamente inexplicáveis - começaram a fazer-se ouvir. Não se assustou (nem ele nem a mulher, igualmente livre de preconceitos) e procuraram, por todos os meios, verificar as causas do fenómeno. Mas o facto é que a "coisa" se lhes escapava. Por fim, assentaram que lá o que era fazia-se notar por passadas: alguém, absolutamente invisível, andava na casa, subia e descia as escadas, ia a certo quarto...e sumia-se. Isto ocorria a certas horas da noite e não em todas. Chegaram à conclusão de que o fantasma só aparecia nas noites de lua cheia e, nessas, era infalível. E como já lhe conheciam a mania, deixavam-no andar à vontade, acomodando-se àquela presença inofensiva. Um dia, o fantasma variou o passeio habitual. Deixou de subir e descer as escadas e de visitar o tal quarto (aquele que morrera o capitão) e limitou-se a passear pelo corredor que, da porta de entrada, levava à cozinha, situada precisamente no outro lado da casa. Entrava (com a porta fechada), ia à cozinha, voltava pelo menos caminho e...sumia-se. Ouviam-se distintamente os passos: de pessoa idosa, passos pesados, vagarosos...O corredor tinha interruptores de luz eléctrica. E mais uma vez o meu amigo e a mulher, nas noites de lua cheia (nas tais em que a visita do fantasma do capitão era certa) colocavam-se junto dos interruptores, com a casa às escuras. Mal ouviam os passos esperavam que a "coisa" passasse por cada um deles. Acendiam a luz. Nada viam; os passos sumiam-se. Voltando a apagar a luz, os passos continuavam, um pouco mais além. Isto repetiu-se várias vezes. Por fim, encolheram os ombros...e deixaram o fantasma à vontade, com a sua mania deambulatória. Aconteceu, porém que o meu amigo resolveu fazer grandes obras em casa. E uma delas foi cortar o corredor, abrindo outra entrada, directa, para a cozinha, isto é, sem devassar a casa toda. E o certo é que o fantasma...nunca mais se ouviu!" Como já disse, conheci as pessoas referidas, conheci as casas, mas confesso que, para tão insólitos casos nunca conheci explicações convincentes...
Escrito por: José Luís Azevedo Rosas de Araújo.
Retirado de "A Aurora do Lima"; Número 21; Sexta-feira, 12 de Março de 2010; página 12


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